quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Como funciona o WikiLeaks

Como você descobriria que um presidente da França usa a popularidade de sua bela esposa, uma ex-modelo, para aumentar as chances dos interesses franceses em outros países? Ou que o governo brasileiro "disfarçou" a prisão de terroristas e que a diplomacia brasileira durante o governo Lula foi vista como "antiamaericana"? Há algumas opções: você poderia ser um espião, um diplomata norte-americano no Brasil, ou, simplesmente, esperar que um site especializado em revelar documentos secretos publicasse essas informações. Esse site existe e chama-se WikiLeaks.






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WikiLeaks
O WikiLeaks é uma organização internacional sem fins lucrativos cuja proposta é divulgar e comentar documentos que tragam informações consideradas sensíveis e que atestem a má conduta de governos e grandes corporações. O WikiLeaks trabalha com documentos oficiais que de alguma forma foram "vazados" e chegaram às mãos de seus integrantes.

O site tem estado no centro de polêmicas internacionais por conta de suas revelações, como a feita em abril de 2010 quando um vídeo secreto, feito pelas Forças Armadas dos Estados Unidos, mostrou o desastrado ataque de um helicóptero militar norte-americano no Iraque em 2007 que resultou na morte de vários civis, inclusive dois correspondentes da agência Reuters. Mas esse foi apenas um dos várias escândalos provocados pelo WikiLeaks e que deixaram muita gente poderosa em situação constrangedora. Conheça um pouco da história e do modo de operar desses autoproclamados defensores radicais da verdade e da transparência.





Mistério e teorias da conspiração

Um dos mistérios que cerca o WikiLeaks é sobre as pessoas que o fazem. Julian Assange é um dos poucos fundadores e diretores conhecidos da organização. Segundo a BBC, Assange nasceu na Austrália em 1971 e na adolescência já tinha demonstrado seu talento para a matemática. Em 1995, sua habilidade como hacker foi descoberta pelas autoridades australianas e ele foi condenado a pagar uma multa de vários milhares de dólares, mas escapou da prisão. Passou então os três anos seguintes investigando junto com a pesquisadora Suelette Dreyfuss o lado subversivo da internet. A pesquisa resultou no livro "Underground". Assange cursou física e matemática na Universidade de Melbourne antes de se tornar um radical defensor da transparência nas informações. Mas sua trajetória inclui também uma acusação de estupro, feita por um promotor sueco após sua passagem pelo país em agosto de 2010. O diretor do WikiLeaks alega que a acusação faz parte de uma campanha internacional para desacreditá-lo e, consequentemente, também o site. O caso está na Suprema Corte sueca.



WikiLeaks: origem e modo de operar


O WikiLeaks surgiu para o público em janeiro de 2007, quando seus fundadores anunciaram a iniciativa da organização, sem fins lucrativos, de divulgar informações obtidas através de documentos confidenciais vazados de grandes corporações e governos que interessassem à opinião pública mundial. No começo muitos dos documentos disponibilizados foram fornecidos por pessoas interessadas em denunciar (por motivo de justiça ou vingança) seus ex-empregadores, mas os mais importantes estavam relacionados a histórias de interesse público. No começo, a base de operações da organização estava na Suécia.

O site surgiu com o intuito principal de expor os regimes opressivos na Ásia, nos ex-países que formavam a União Soviética, no Oriente Médio e na África, mas também esperava ser uma forma de apoiar "as pessoas de todas as regiões que desejassem revelar comportamentos antiéticos de seus governantes e corporações". Atualmente o WikiLeaks estabeleceu como política editorial dedicar-se unicamente a documentos de interesse ético, político, diplomático ou histórico.

O que se sabe do funcionamento do WikiLeaks mostra que sua forma de operar é composta basicamente por quatro etapas. Alguém com acesso aos documentos secretos os entrega a um integrante ou colaborador do WikiLeaks. A organização não registra informações que levem à identificação de quem entregou os documentos vazados. O WikiLeaks afirma que quando possível faz uma verificação para estabelecer a confiabilidade da pessoa que vazou o material. Depois, os documentos são analisados pela equipe da organização para que seja atestada a autenticidade do material. Segundo o diretor Julian Assange, nessa etapa, cinco especialistas checam a veracidade das informações contidas nos documentos. Finalmente, os documentos são disponibilizados no site, junto com um resumo de seus conteúdos. A organização pode também distribuir a documentação a alguns dos mais respeitados veículos de comunicação para uma divulgação simultânea das informações.

Os defensores do WikiLeaks afirmam que ele protege as fontes de informações, os jornalistas e os ativistas que querem divulgar material considerado confidencial mas que seria de interesse público. Já seus críticos, acusam o site de ameaçar a segurança nacional dos países atingidos pelo vazamento e de colocar em risco também a vida de pessoas cujas identidades devem ser mantidas em segredo.

Para garantir a segurança e o anonimato de suas fontes, Assange afirma que a organização tem criptografado tudo, espalhado suas instalações por vários países, como a Islândia e a Bélgica, e as comunicações têm sido feitas a partir do redirecionamento das ligações por diversos locais, de forma a evitar o rastreamento. Segundo ele, muitas vezes o dado vazado chega ao WikiLeaks pelo correio, endereçado a uma caixa postal, sem identificação da fonte. Em todos os casos, todo material, exceto os documentos, é imediatamente destruído para eliminar qualquer pista que possa levar a quem os vazou. Leia mais abaixo quais foram alguns dos documentos secretos publicados pelo WikiLeaks entre 2007 e 2010.





Verificando a veracidade

Segundo o WikiLeaks, todas as histórias e documentos recebidos são detalhadamente checados. Para atestar sua veracidade, cada documento recebido é minuciosamente examinados por especialistas e submetido a uma etapa de verificação na qual o WikiLeaks procura saber quem teria motivo para falsificar aquele tipo de documento e por qual razão. A organização afirma que usa as técnicas tradicionais do jornalismo investigativo junto com as mais modernas tecnologias. Geralmente, é feita uma análise forense do documento e verificado o custo, os meios e os motivos para uma eventual falsificação. A organização busca comprovar a autenticidade dele também a partir de elementos externos. Por exemplo, no caso do vídeo que mostrou o ataque do helicóptero militar norte-americano no Iraque, em 2007, que causou vítimas civis, a organização afirma que enviou uma equipe de jornalistas ao Iraque para entrevistar as vítimas e as testemunhas do ataque. Essa equipe teria obtido registros nos hospitais, atestados de óbitos e outras evidências que ratificaram a veracidade do material que o WikiLeaks havia recebido.





WikiLeaks: denúncias e constrangimentos

A proposta do WikiLeaks é de promover a transparência radical nas informações para mostrar à população "como o mundo funciona", segundo Assange. A organização afirma que é um grupo mundial independente formado por pessoas com uma longa trajetória de dedicação à defesa de uma imprensa livre e da transparência derivada disso. Desse grupo, segundo o site, participariam jornalistas com reconhecida credibilidade, programadores, engenheiros de rede e matemáticos, entre outros profissionais. 


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Página da internet com documentos secretos
disponibilizados pelo WikiLeaks



Veja a seguir alguns dos fatos revelados pelos documentos secretos disponibilizados pelo WikiLeaks entre 2007 e 2010:
  • Climagate: na véspera da conferência sobre o clima patrocinada pela ONU e realizada em Copenhague (Dinamarca) em 2009, milhares de e-mails trocados entre cientistas, que defendem a tese do aquecimento global causado pelo homem, com a Unidade de Pesquisa do Clima, da Universidade de East Anglia, na Inglaterra, um dos mais respeitados centros de pesquisa sobre mudanças climáticas no mundo, vazaram e foram divulgados pelo WikiLeaks. O teor de muitos e-mails colocava em dúvida a ética de alguns cientistas na condução das pesquisas e no compartilhamento dos dados. O escândalo ficou conhecido como "climagate". 
  • Segredos da Cientologia: em março de 2008, o WikiLeaks divulgou uma série de documentos considerados as "bíblias secretas" da Igreja da Cientologia, seita fundada pelo escritor L. Ron Hubbard e que conta com muita gente famosa entre seus seguidores. Os documentos mostram como os seguidores da seita podem alcançar os oito diferentes níveis da Cientologia, nos quais "muitos fenômenos" podem acontecer. Normalmente, para alcançar cada um desses níveis o seguidor da seita tem de desembolsar muito dinheiro.
  • Diplomacia-espiã: em novembro de 2010, o WikiLeaks começou a divulgar junto com cinco dos mais importantes jornais do mundo - entre eles o "El País", da Espanha, e  o "The Guardian", da Inglaterra - cerca de 250 mil comunicados oficiais entre as embaixadas e consulados dos Estados Unidos ao redor do mundo e Washington, enviados entre 1966 e 2010. As comunicações revelaram a visão norte-americana sobre líderes e ações governamentais em diversos países. Entre as milhares de informações contidas nesses telegramas e relatórios diplomáticos, está registrado que o governo chinês contrata e usa hackers para fazer invasão de sistemas de computadores de governos e empresas ocidentais e de inimigos políticos, que os diplomatas americanos desconfiam que há uma ligação entre o premiê russo Vladimir Putin e o primeiro-ministro italiano Sílvio Berlusconi, que incluiria lucrativos contratos de energia, e que o rei Abdullah, da Arábia Saudita, solicitou várias vezes para que os Estados Unidos atacasse o Irã.
  • Guerra no Afeganistão: em julho de 2010, o WikiLeaks divulgou milhares de documentos sobre as ações militares das tropas internacionais no Afeganistão. Em cerca de 90 mil documentos elaborados entre 2004 e 2009 são revelados detalhes da guerra travada pelas tropas dos Estados Unidos e dos países da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) contra o Taleban. Segundo esses documentos, o serviço de espionagem do Paquistão estaria ajudando o Taleban e também colaborando com a Al-Qaeda. O material mostra queixas dos afegãos sobre a corrupção no governo local e registra erros em ações militares que resultaram na morte de civis e causaram a perda de confiança da população nas tropas estrangeiras.